Os cidadãos brasileiros colocam em xeque há algum tempo o papel de nossas universidades. Exige-se maior compromisso com o desenvolvimento sustentável e transformação da sociedade.

A universidade é instada a retribuir o investimento recebido da comunidade. É justíssimo. Além de garantir a excelência do ensino e de sua produção científica, precisa satisfazer a cobrança por acesso para todas as camadas sociais, por maior diversidade interna social, cultural e étnica, por eficiência administrativa, transparência.

Deve ao mesmo tempo agilidade nas respostas aos requisitos do setor produtivo e oferecer contribuição mais relevante para o desenvolvimento do País.

Diante dessa realidade, a USP (Universidade de São Paulo) passa por rico debate interno. O desafio é encontrar caminhos curtos e seguros para rever conceitos e métodos, para modernizar processos, para valorizar a comunidade acadêmica e a sociedade, garantindo sua autonomia e ampliando sua posição estratégica no desenvolvimento político, intelectual, científico, cultural e social do Brasil.

Particularmente nossa compreensão é a de que é mister contemplar democraticamente a enorme diversidade social, cultural, étnica e econômica que caracteriza nossa sociedade. A forte ampliação da inclusão social deve ser promovida pela USP para atender a essas expectativas. Isso exigirá expressivo aumento do apoio às necessidades do alunado, não só para facilitar o acesso, mas também para oferecer condições de permanência, sem as quais todo o esforço inicial pode se perder.

Também se espera da Universidade maior oferecimento de vagas e expansão geográfica de seus cursos. Coordenar o processo de inclusão social e a demanda por mais vagas com o compromisso com a excelência acadêmica impõem da gestão da nossa USP mais do que voluntarismo, é preciso ter a experiência necessária que só o convívio respeitoso e o reconhecimento de toda a nossa diversidade trazem.

É preciso enfrentar tais questões com serenidade e responsabilidade, da mesma maneira como devemos dar satisfações à sociedade sobre nossos gastos. A USP sobrevive, principalmente, do dinheiro público e por isso deve buscar sempre o equilíbrio econômico e financeiro. A autonomia financeira não equivale a um mandato para o uso irresponsável de recursos públicos.

Em paralelo, há o questionamento, também legítimo, sobre a limitada participação nos processos decisórios. É imperioso ampliar o máximo possível essa representatividade, incluindo,cada qual dentro de suas características, todos os seus setores: docente, discente e técnico-administrativo. Mais do que isso, é preciso encontrar uma solução para ampliar adequadamente a participação da sociedade na condução da Universidade.

Sabemos que não há resposta única para uma instituição cujos valores essenciais estão intimamente ligados à diversidade de opiniões, de métodos, de teorias e de doutrinas. Compatibilizar essas demandas externas entre si, com as demandas internas da Universidade, constituiu grande desafio. Se a USP não dedicar todas as suas energias a enfrentar seriamente cada uma dessas demandas, dificilmente poderá continuar reivindicando a legitimidade que estabeleceu o fundamento de sua autonomia.

A USP é herdeira legítima de uma tradição multicentenária que consiste essencialmente em cultivar, preservar e defender a mãe de todas as liberdades, o direito ao livre debate e à livre expressão do pensamento. No período mais obscuro de nosso passado recente, manteve redutos intelectuais de grande importância, que se opuseram ao autoritarismo e constituíram referência no debate sobre a redemocratização do país.

As pressões externas exercidas sobre a USP em favor de valores democráticos - como as políticas de acesso e envolvimento no desenvolvimento nacional - são, em si, legítimas. Mas há pressões internas que devem ser ponderadas para que não se ponha em risco tais ideais. Além do risco de um desequilíbrio financeiro gerado por atitudes populistas e oportunistas, há o perigo de uma radicalização partidária da vida universitária, o que agrediria normas básicas de convivência cívica.

A USP tem compromisso com o debate e a negociação, mas não pode abrir mão do respeito ao estado de direito e dos valores democráticos que caracterizam uma sociedade civilizada. Temos de garantir a manifestação de todos, mantidas as regras de convivência pacífica, indispensáveis à vida acadêmica e em comunidade. É o momento de investir sistematicamente na busca da necessária pacificação, no trato sereno das questões polêmicas; é hora de valorizar a persuasão e a reflexão como meios, talvez únicos, de se buscar entendimentos. Em um local tão heterogêneo como a USP, não haverá consensos universais, mas trabalhando aquilo que melhor temos a oferecer à sociedade, qual seja a nossa capacidade de reflexão e entendimentos, poderemos avançar na direção que é comum a todos, o bemestar da sociedade.


 

* Hélio Nogueira da Cruz professor titular (1989) da Faculdade de Economia, Administração e Contabilidade (FEA)

* Telma Zorm vice-diretora do Iinstituto de Ciências Biomédicas da Universidade de São Paulo (USP)

 


 


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