Paulo Speller (foto) e Lauro Morhy debatem propostas de autonomia didático-científica, administrativa e de gestão financeira e patrimonial
Autonomia universitária foi tema da terceira sessão aberta da Comissão UnB.Futuro, realizada na tarde desta segunda-feira, 1.° de julho, no Auditório da Reitoria. A decisão soberana sobre aplicação de recursos, contratação de professores, estruturação de cursos e priorização de pesquisas são algumas das características de uma universidade em regime de autonomia, sistema anunciado pela Constituição de 1988, mas jamais colocado em prática integralmente.
O debate "Autonomia e o Futuro da Universidade" teve como conferencista o professor Paulo Speller, secretário de Educação Superior do Ministério da Educação e ex-reitor da Universidade Federal do Mato Grosso e da Universidade de Integração da Lusofonia Afro-Brasileira (Unilab). Tendo em seu currículo uma passagem pela Universidade de Brasília entre os anos de 1966 e 1968, quando era estudante de psicologia, Speller destacou o papel da UnB como referência para as demais universidades. “É uma história que até hoje nos inspira muito”, declarou.
Um Auditório com “colegas qualificados para debater o futuro da universidade”, como observou o reitor Ivan Camargo, ouviu do secretário os planos do MEC para a criação de uma universidade aberta no Brasil, como já ocorre na Europa e em países como Índia e China. “Estamos atrasados”, declarou. “O modelo de universidade que temos hoje foi criado para poucos e ainda permanece assim”.
Speller fez também um alerta para a necessidade de qualificar o investimento na educação. “Não basta colocar 6% ou 10% do PIB na educação. É preciso saber onde e como este recurso será aplicado”, sentenciou. O secretário chamou de “desesperador” o índice de evasão nos cursos de licenciatura e falou do ensino básico, ponto central da sessão anterior da Comissão (para ler: http://www.unb.br/noticias/unbagencia/unbagencia.php?id=7788). “É preciso maior interação das universidades com a educação básica, em especial com o ensino médio, que não está recebendo o foco devido”, advertiu.
Paulo Speller destacou a importância do Conselho Diretor da UnB como um dos pontos da concepção original da Universidade de Brasília e afirmou que um grande debate está sendo preparado pelo governo federal sobre a política de educação superior no país. Ao lembrar que desde 2003 há um Projeto de Lei sobre a reforma universitária tramitando no Congresso Nacional, o secretário explicou que o objetivo da academia deve estar além da obtenção de destaque em rankings internacionais. “Cada universidade, no seu âmbito de atuação, deve ter um papel estratégico desenhado”, afirmou. “Sem autonomia não há como pensar em nós exercermos este papel estratégico”.
Para o titular da Secretaria de Educação Superior do MEC, a ideia da autonomia universitária não é um consenso entre os reitores. Esta percepção é compartilhada pelo professor Ivan Camargo, para quem possivelmente a maioria dos reitores não deseja autonomia. “Dificilmente será da Andifes (Associação Nacional dos Dirigentes das Instituições Federais de Ensino Superior) que sairá uma proposta neste sentido”, avaliou.
Outro ponto de convergência nas visões de Camargo e Speller é a importância dos estudantes no cotidiano acadêmico. Para o secretário, “a presença integral do estudante dentro da universidade é o que traz vida para a instituição”. Speller relembrou seus dias de aluno da UnB, quando, junto dos colegas, participava dos debates dentro e fora da sala de aula, tais como atividades culturais e políticas realizadas. “O espírito de solidariedade entre os estudantes era uma das características fortes da UnB e deve ser sempre estimulado”, concordou Ivan.
AUTONOMIA
O professor emérito e ex-reitor da UnB (1997-2005) Lauro Morhy participou do encontro da Comissão UnB.Futuro como debatedor. Tendo a autonomia universitária como uma das tônicas de seus dois mandatos, Morhy iniciou sua fala apresentando uma reflexão do cientista político Simon Schwartzman, feita por ocasião da promulgação da Constituição de 1988, que definiu, em seu artigo 207, que as universidades gozam de autonomia didático-científica, administrativa e de gestão financeira e patrimonial.
Simon Schwartzman alertava, já em 1988, sobre a importância das universidades públicas federais terem uma personalidade jurídica própria. “A autonomia universitária só se transformará em realidade se as universidades públicas adquirirem personalidade jurídica própria, que não as confundam com os demais órgãos da administração federal”, escreveu. >> Para ler o texto na íntegra.
O professor Lauro Morhy relembrou o trabalho do ex-reitor da UnB, João Claudio Todorov (1993-1997), que propunha a regulamentação da autonomia universitária, e a frustração das expectativas porque a mesma não ocorreu no âmbito da Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDB).
Partidário do princípio de que a autonomia deve ser conquistada e não simplesmente concedida, Morhy defende um período experimental de cinco anos para que a universidade atinja o regime de plena autonomia. O ex-reitor propõe também a instalação de um sistema que ele chamou de “autonomia dual”, diferenciando os recursos vindos da União daqueles gerados pela própria universidade. “O que vem do Orçamento da União deve ser fiscalizado pelo Tribunal de Contas da União”, defende. “Mas o que é oriundo dos recursos e investimentos da própria universidade deve ser objeto de auditoria independente”.
Para Lauro Morhy, a UnB é um caso particularmente emblemático da complexidade do tema da autonomia universitária. “A lei de criação da UnB lhe destinava uma grande quantidade de ações da antiga Companhia Siderúrgica Nacional (CSN), o que nunca ocorreu”, relembrou.
HOMENAGEM
Na sessão coordenada pelo professor Isaac Roitman, a Comissão UnB.Futuro também realizou uma homenagem ao ex-reitor Lauro Morhy, na tarde desta segunda-feira. Ele recebeu das mãos do secretário Paulo Speller uma placa como agradecimento por sua trajetória acadêmica, dedicada às atividades de ensino, pesquisa e extensão e à promoção da autonomia universitária.